Comentário de José Farhat

Pela redação do jornal libanês The Daily Star Duas vezes “circuncidada”, Wafaa Helmy jurou que suas duas filhas jamais sofreriam o mesmo destino. Porém, certa noite, sua própria mãe secretamente levou a mais velha para se submeter à faca, em sua aldeia do Alto Egito. A despeito dos pronunciamentos ao contrário tanto de clérigos muçulmanos quanto cristãos, ela acredita, tal como muitas egípcias, que esta “purificação” é um dever religioso que ajuda a preservar a virtude e a honra da menina. O estigma social de não ter os lábios vulvares ou o clitóride de sua neta cortado era muito forte para ela. As estatísticas oficiais egípcias dizem que 97% das mulheres dos 15 aos 49 anos, cristãs ou muçulmanas igualmente, sofreram mutilação genital feminina (MGF), também conhecida como “circuncisão feminina”. Em junho, em seguida à morte de uma menina de 12 anos, Hatem al-Gabali, o Ministro da Saúde assinou um decreto proibindo a todo médico e membro da profissão médica de executar este procedimento. Esta proibição necessita ainda de sua transformação em lei e poderá enfrentar um duro debate na próxima sessão do Parlamento em novembro próximo. Uma proibição já havia sido imposta em 1997, mas as operações foram permitidas em “casos excepcionais”. Esta MGF pode causar a morte através de infecção, hemorragia e complicações posteriores durante o parto. Também traz riscos de problemas do trato urinário e trauma mental. “É um grande problema com o meu marido. Nós discutimos o tempo todo. Eu nunca quero fazer amor. Não tenho reação, nem sentimentos, nem prazer”, diz Helmy, 35 anos, participando de uma sessão, organizada pela ONG “Centro Copta para a Educação e o Desenvolvimento”, em Igreja de Bayad al-Arab, ao sul do Cairo. Helmy, uma cristã copta, foi circuncidada duas vezes aos 10 anos de idade porque “um pedacinho ainda havia sido deixado”. Kawkaba Fathi, uma muçulmana, encontrou o seu próprio caminho para tratar do problema. “Eu finjo que estou gostando, para manter meu marido feliz, e está ficando bem melhor”, diz ela, sua face plácida arredondada emoldurada por um véu preto. A operação de Fathi foi realizada “do modo sudanês”, significando que todo os seus órgãos genitais externos foram cortados. Traumatizada, ela decidiu com seu marido que a operação não seria realizada em suas três filhas. Cerca de 60 mulheres, todas circuncidadas, se reuniram para ouvir o ginecologista da ONG. “A circuncisão é uma velha tradição e nada tem com a religião”, disse Mariam Munib. Algumas mulheres acenaram com a cabeça, porém outras ficaram preocupadas com o que as pessoas iriam dizer. “E se o marido rejeitar minha filha em sua noite de núpcias porque não foi circuncidada?”, perguntou uma mãe. “As pessoas têm que saber se uma menina é normal, se [seus órgãos sexuais] são muito grandes, ou deformados?” Disse outra, fazendo eco a uma crença entre muitas daqui de que genitais muito “proeminentes” devem ser cortados – no mínimo, se são mulheres. “Você leva sua filha ao médico para saber se seu nariz ou seus olhos são muito grandes ou pequenos? Então, por que terá você que fazê-lo para aquela parte do corpo?”, pergunta a Irmã Joanna, a miúda e ligeiramente severa freira copta que dirige a ONG. O governo até mesmo convocou as mais graduadas autoridades religiosas para que levassem a suas congregações uma mensagem contrária àquilo que a UNICEF descreve como “uma das violações mais persistente, penetrante e silenciosamente suportada dos direitos humanos”. Mohammad Sayyed Tantawi, o xeique da Universidade Al-Azhar, a mais alta autoridade sunita, e o patriarca copta Shenoud III também declararam que ela não tem fundamento nos textos religiosos muçulmanos ou cristãos. O Centro está particularmente preocupado com as meninas com idade entre 8 e 12 anos, época principal para a circuncisão. Organizando seminários em 15 aldeias dos desertos do alto Egito, os ativistas presenteiam com chá, sabão em pó e sabonete para encorajar as mulheres para que participem. A Irmã Joanna insiste que está havendo progresso! “Dez anos atrás era tabu até mesmo dizer circuncisão feminina”, diz ela, citando progressos apesar da desconfiança difundida localmente, incluindo rumores de que ela está forçando uma imposição ocidental “para corromper as meninas egípcias”. *Traduzido e a seguir comentado por José Farhat Especialmente para divulgação pelo CORREIO DO ICARABE.