Novo sheik quer divulgar a verdadeira face do Islã

Ter, 03/04/2007 - 00:00
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Nesta entrevista ao ICArabe, Mohammad Moughraby fala sobre a necessidade de os muçulmanos se unirem e disseminarem a religião através do exemplo. Entre outras questões, aborda ainda sua preocupação com a perda de identidade, a situação da mulher na religião islâmica e o avanço de correntes fundamentalistas em alguns países do Oriente Icarabe: Qual o tamanho da comunidade muçulmana no Brasil e no Estado de São Paulo? Mohammad Moughraby: O Estado de São Paulo deve ter um milhão de muçulmanos e o Brasil inteiro em torno de 1,5 milhão. Mas os números são incertos, não há um censo que dê essa idéia exata. É nosso projeto fazê-lo. Icarabe: Apesar do grande número de seguidores, o Islã tem sido sistematicamente atacado. Qual a impressão que tem da divulgação feita hoje sobre a religião? Moughraby: Quando cheguei ao Brasil, tive a impressão que a divulgação do Islã era estagnada e restrita ao sermão da sexta-feira. Não há difusão através da mídia e os esforços nesse sentido são insuficientes. Não se realizam visitas às pessoas em suas casas, não se pensou em ter uma estação de rádio, um canal de TV. Não há um objetivo que envolva toda a comunidade. Mudar isso e ampliar esse universo é um desafio das sociedades muçulmanas. Quero reuni-las para, através do trabalho coletivo, dar impulso nesse sentido. Em primeiro lugar, pretendo incentivar a massa, jovens, idosos, mulheres, crianças. Icarabe: Seria importante mudar isso até para apresentar a real imagem do Islã à sociedade brasileira? Moughraby: Estou preocupado com a imagem atual do islamismo e é um grande desafio apresentar sua verdadeira face. Além disso, fico apreensivo com a diluição da geração muçulmana e árabe na sociedade. Está havendo perda de identidade. Icarabe: Como pretende enfrentar esses desafios? Moughraby: Quero marcar um encontro com o Ministro das Comunicações para ver a possibilidade de ter uma estação de rádio, um canal de TV para conseguir ampliar a divulgação e mostrar a face verdadeira do islamismo. Além disso, como ponto de partida, estamos atraindo as crianças para dentro da mesquita. Reservamos todos os sábados, das 10h às 12h, para que aprendam o idioma e sobre a religião. Não damos lição de casa, deixamos que brinquem muito, que é o que gostam de fazer. Pretendemos, inclusive, comprar um outro espaço para criar lugares adequados a elas, como um parquinho, quadras. Às suas mães, proferimos palestras, por exemplo, sobre a história do Profeta. Antes algumas deixavam as crianças e depois voltavam para buscar. Atualmente, esperam pela preleção. Os jovens vêm aos domingos, de tardezinha. Fazem suas orações e depois dirigem-se à quadra anexa para jogar futebol de salão. Depois, ficam para a reza do crepúsculo. A eles, também é feita breve apresentação. Queremos que o pessoal sinta a cultura islâmica e entenda o que é lícito e o que não é de forma correta, saudável, amigável, que mais atrai do que espanta. A religião vem para facilitar a vida de todo mundo, não há porque complicá-la através dela. Temos que apresentar essa parte bonita do Islã e não ficar dizendo “isso não pode, aquilo é pecado”. Icarabe: Qual a média de freqüência de crianças no sábado e de jovens no domingo? Moughraby: Quando comecei, há cerca de um mês, eram 26 crianças a partir dos cinco, seis anos. Hoje, são mais de 80. E jovens, cerca de 60. Icarabe: Qual a sua impressão em relação à mídia brasileira? Moughraby: Fui a um encontro no Estadão e falamos sobre essa questão. Fiquei surpreso, eles querem saber mais sobre a religião. Solicitaram palestras sobre o Islã, os ditos do Profeta. Prometi que faria. Icarabe: O senhor acredita que o Islã seja objeto de preconceito, em função do desconhecimento? Moughraby: Quando acontece um ataque à religião e difamação, isso desperta a curiosidade no mundo inteiro sobre o que é o islamismo. Assim, estou conseguindo dialogar com as pessoas, o que é muito bom. Devemos aprender com os muçulmanos na França, que, com o pouco que têm de mídia, estão conseguindo muita coisa. Naquele país, 100 pessoas se convertem ao islamismo todo dia. Basta praticar a religião da forma correta para melhorar essa imagem, pois o pessoal olha para o islamismo através das pessoas e de atos isolados, não através da doutrina. Deus quer que a religião se propague, mas os muçulmanos hoje em dia são fracos primeiramente em praticar, para depois conseguir divulgar. Icarabe: E os muçulmanos tem um papel importante para divulgar a religião de forma correta... Moughraby: Muito importante. Eles têm que levantar essa bandeira de demonstrar a face verdadeira do islamismo. O desenvolvimento no Ocidente foi alimentado através dessa cultura, quando a Europa estava mergulhada na escuridão e na ignorância. Queremos mostrar que o Islã oferece novamente à sociedade humana os benefícios da doutrina para que a pessoa viva de forma agradável e melhor. Icarabe: Como a mulher é vista no islã? Moughraby: O pessoal tem que saber primeiro como a mulher era tratada antes e depois do islamismo para poder comparar. Antes, consideravam-na não como um ser humano, mas como um animal em forma de gente. Ela não tinha direito à herança, não tinha direito algum. Deus, quando começou a propagar o islamismo, quis difundir a igualdade entre o homem e a mulher. Como ensinou o Profeta, quem trata a mulher muito bem é uma pessoa generosa e quem a trata mal não tem caráter. Ele sempre aconselhava todos os homens a tratarem-na da melhor forma possível, a exemplo do que fazia em sua casa, no relacionamento com sua esposa Hadija. Icarabe: E a questão do véu no Islã? Moughraby: O véu é uma ordem divina, para preservar a mulher, assim como a reza e o jejum. Só que não podemos forçar as pessoas a cumpri-las. Não é uma novidade que o Islã inventou, sempre foi usado, mesmo na doutrina cristã. Em nenhum momento aparece a imagem da virgem Maria sem véu. Icarabe: Como o senhor vê o avanço do fundamentalismo islâmico em alguns países? Moughraby: Acredito que seja devido à falta de informação correta sobre a religião. É preciso decifrar o Alcorão e entender bem o Islã, para bem aplicá-lo. A interpretação de uma forma incorreta acarreta fundamentalismo ou fanatismo. Icarabe: Pretende ficar no Brasil? Moughraby: Inshallah. Por enquanto, meu compromisso é com o Brasil.