A Declaração Balfour de 1917

Seg, 02/11/2015 - 21:28
A leitura do texto a seguir é um exemplo da correspondência oficial da Grã Bretanha imperial e propositadamente comprometida com fatos e seus contrários, um exemplo de cinismo e contradição:

"Caro Lord Rothschild,

"Tenho o grande prazer de endereçar a V. Sa., em nome do governo de Sua Majestade, a seguinte declaração de simpatia quanto às aspirações sionistas, declaração submetida ao gabinente e por ele aprovada:

`O governo de Sua Majestade encara favoravelmente o estabelecimento, na Palestina, de um Lar Nacional para o Povo Judeu, e empregará todos os seus esforços no sentido de facilitar a realização desse objetivo, entendendo-se claramente que nada será feito que possa atentar contra os direitos civis e religiosos das coletividades não-judaicas existentes na Palestina, nem contra os direitos e o estatuto político de que gozam os judeus em qualquer outro país.´

"Desde já, declaro-me extremamente grato a V. Sa. pela gentileza de encaminhar esta declaração ao conhecimento da Federação Sionista.

"Arthur James Balfour."

Quase um século depois da assinatura e entrega da Carta, seu preciso significado continua sendo discutido por todos os lados interessados, inclusive entre os próprios sionistas. Começa que o significado da correspondência contradiz o Acordo Sykes-Picot, através do qual França e Grã Bretanha dividiam os países árabes, sem menção alguma ao suposto “Lar Nacional para o Povo Judeu”. 

Também fica longe das promessas da Correspondência Hussain-McMahon. As Cartas trocadas entre o então Amir de Meca e depois Rei do Hijaz (cidade e região atualmente no território da Arábia Saudita), Hussain Ibn Ali Al-Hachemi, e o então Alto-Comissário Britânico no Egito, Sir Henry McMahon (1862-1949), que em si mesmas contém outras contradições. McMahon negociava com Hussain, igualmente em nome do Governo de Sua Majestade Britânica, mas as promessas britânicas não foram cumpridas. Pelo acordo, por entrar na guerra contra o Império Otomano, os árabes teriam sua independência e Hussain reinaria num país a ser criado que incluía precisamente tudo aquilo que foi prometido aos sionistas, mais todos os países criados pelo acordo Sykes-Picot.

Vale a pena lembrar que enquanto a Grã Bretanha apoiava Hussain, também usava, com absoluta falta de vergonha, os cofres do Tesouro Britânico para manter Abdul Aziz Ibn Saud (1876-1953), fundador da Arábia Saudita, disputando as mesmas terras que Hussain queria.  

Os sionistas, encabeçados em Londres por Chaim Azriel Weizmann (1874-1952), que se tornaria presidente de Israel, e Nahum Sokolow (1859-1936), que nunca esteve na Palestina,, trabalharam duramente para conseguir o posicionamento do Governo Britânico, mas a Carta de Balfour ficou aquém das expectativas sionistas que reivindicavam a reconstituição da Palestina como “o” Lar Nacional para o Povo Judeu, enquanto a declaração falava “que nada será feito que possa atentar contra os direitos civis e religiosos das coletividades não judaicas na Palestina”. Os árabes também não aprovaram a Declaração Balfour inclusive por não chamá-los pelo nome e nem tampouco dizer quais eram os seus direitos políticos e nacionais.

Para o Governo Britânico os árabes pouco importavam diante de seu objetivo que era unir os judeus, principalmente aqueles dos Estados Unidos, no apoio aos Aliados e contra as potências centrais, na I Guerra Mundial (1914-1918). 

Outro objetivo britânico dizia respeito a manter na entrada do Canal de Suez, no caminho para suas possessões na Índia, um Estado leal a eles. 

Os franceses, seus aliados na divisão das terras no Oriente Médio através do Acordo Sykes-Picot, com o estabelecimento de um estado judeu, ficariam impedidos de ocupar a Palestina, que era o desejo oculto da França.

Os principais Aliados da I Guerra Mundial, desleais uns com os outros e assinando algo que sabiam que não cumpririam, endossaram a Declaração Balfour e, inclusive, consentiram que ela fizesse parte do Mandato sobre a Palestina, a ser cumprido pela Grã Bretanha e que foi formalmente aprovado pela recém-criada Liga das Nações em 24 de julho de 1922.

Ocorre o Governo Britânico, uma vez mais, assumiu uma política para a Palestina que desrespeitava suas promessas anteriores quando, em maio de 1939 publicou um White Paper recomendando um limite de 75.000 imigrantes judeus, a menos que os residentes Árabes Palestinos da região consentissem outras imigrações e estabelecendo o fim das imigrações no ano de 1944. Tudo que vem do Governo Britânico, como estamos vendo aqui, tem duas cores e duas faces que mudam ao sabor dos interesses do momento. 

Os sionistas condenaram a nova política britânica e acusaram os britânicos de favorecem os Árabes. Os sionistas fingem ter memória curta e, quando a política britânica lhes era favorável, com a Declaração Balfour, simplesmente fingiam não saber que a Palestina era habitada e que seus habitantes tinham direitos que estavam sendo pisados.

Veio a II Guerra Mundial (1939-1945) e os sionistas continuaram a imigrar e, com base na Declaração Balfour, a argumentação que a Palestina lhes foi dada por Deus, a divisão da Palestina foi feita pelas Nações Unidas e outras falácias mais, fundaram o Estado de Israel em 1948, e continuam até hoje a judiar do povo da Palestina.