A revolução islâmica de 79, seus problemas e sua importância na região

Sex, 03/03/2006 - 03:50
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A revolução do aiatolá Ruhollah Khomeini instituiu a república e uma forma de fazer política influenciada pelo islamismo. Depois do estado laico do xá Reza Pahlevi, atolado em corrupção e incompetente em resolver as contradições da sociedade iraniana, o movimento de 79 recorreu aos valores tradicionais do islã para se opor aos europeus e estadunidenses. Atualmente, depois de seis eleições, o Irã escolheu em 2005 Mahmoud Ahmedinejad como governante. A vitória do político, considerado conservador, não agradou aos Estados Unidos. Em pronunciamentos logo após as eleições, o governo norte-americano acenava com a seguinte posição: “ ‘Com a conclusão das eleições no Irã, nós não vimos nada que mude nossa opinião de que o Irã está fora do ritmo dos outros países da região’, afirmou o Departamento de Estado norte-americano em comunicado ... Os Estados Unidos --em atrito com Teerã desde a revolução iraniana de 1979-- continuam ‘duvidando de que o regime iraniano esteja interessado nos desejos legítimos de seu povo ou nas preocupações da comunidade internacional’, de acordo com o comunicado” (no site da BBC Brasil). A vitória de Ahmedinejad está dentro de um contexto que deve responder às carências do país. O Irã, um dos grandes produtores de petróleo do mundo, tem o 34º maior PIB do mundo, segundo o Banco Mundial. No entanto, de acordo com a ONU, tem o 99º IDH. A opção por Ahmedinejad - sua retórica mais conservadora – foi feita também porque um dos pilares da campanha do presidente era o uso das riquezas do país para resolver os problemas e pobreza interna. Cattani diz que como prefeito de Teerã, o político era mais pragmático, um administrador e que recorria menos ao discurso retórico. No seu mandato na capital iraniana, privilegiou políticas para os setores mais pobres da população. Na hora de escolher o presidente, essa mesma população rejeitou dezesseis anos de governos que variaram de centristas religiosos a moderados abertos. ‘Ali Akbar Hashemi Rafsanjani, um líder político de centro, seguidor de Khomeini e parte do establishment religioso, governou o Irã por dois mandatos, de 1989 a 1997. Era um dos fortes candidatos para as eleições de 2005 – apoiado por partidos reformistas e iranianos ricos que temiam que o poder fosse tomado por setores mais próximos da retórica do islã -, mas perdeu para Ahmedinejad. Já Mohammed Khatami, político mais moderado e que foi responsável por uma abertura maior para o “Ocidente”, governou de 1997 até 2005. Em uma posição que lamenta pela derrota dos moderados, o atual presidente é visto como uma grande ameaça para a população iraniana. Para Cattani, o Irã com Ahmedinejad pode ser considerado um governo fascista. Ele cita o caso das charges, que exemplificam o uso que o presidente faz do islã para angariar apoio político. “Você vê que o Ahmadinejad, no Irã, tem todo interesse em criar tensão com o Ocidente porque o regime internamente é muito fraco. Essa situação de tensão une o país”. Para ele, o problema da região é que ela está influenciada por um série de clérigos que usam de sua influência religiosa para impor certos modos de vida, impor uma interpretação fundamentalista e rígida do Corão para interesse próprio. “Antes se chegava a um consenso da comunidade islâmica. Não é que qualquer um podia dizer qualquer coisa. Se todo mundo concordava, era adotada. Se todo mundo achava uma barbaridade, era recusado. Hoje esse pessoal se acha livre de impingir em cima dos fiéis, e ainda por cima faz uma pressão violenta sobre os tolerantes, mais moderados, tanto que agora a moderação está acuada. Todo mundo está com medo. Lógico que há várias posições no fundamentalismo. Mas ser moderado hoje dá medo”. O SISTEMA IRANIANO O Estado iraniano não é uma teocracia. Para Paulo Hilu, “é um sistema com eleições definido dentro de um quadro religioso”. Ele destaca um ponto dentro do sistema iraniano: o político está acima do religioso. “Os clérigos controlam até certo ponto, mas o político prevalece e as decisões, inclusive, de cunho religioso, são tomadas por um parlamento eleito. Você tem eleições que elegem presidente. Tudo entra pelo caminho político. A mulher e o homem tem um voto que valem a mesma coisa, o que pela interpretação tradicional do islã não existe”. O professor da UFF diz que a razão dentro do Estado iraniano vem antes da religião e que a arquitetura política do Irã é a de um Estado moderno. “Não é uma democracia, mas tem eleições abertas, muito mais abertas do que na Síria, onde não se vota para presidente. E menos subordinado à religião do que na Arábia Saudita. Então você tem um sistema participatório, algo semelhante ao que há na Venezuela”. Na Arábia Saudita, o islã oficial e os dogmas religiosos têm ascendência sobre o político, enquanto no Irã o político prevalece.