Aziz Ab´Saber fala da importância do estudo das formas de colonização

Sex, 09/12/2005 - 02:50

O geógrafo e professor da USP Aziz Ab´Saber, um dos articulistas do livro “Edward Said: trabalho intelectual e crítica social”, considera que qualquer estudo que analise com consistência os problemas criados pela colonização desde o século XVI até nossos dias “é um estudo muito pertinente e oportuno”. Aziz explica que existe uma tipologia de colônias feita por geógrafos em três grandes tipos. Em primeiro lugar, as colônias de enraizamento, “com a preocupação de colocar um certo conjunto demográfico vindo das áreas de origem que projetam a colonização”, como o que ocorreu no Brasil no século XVI. Os outros dois são mais recentes, e foram também detidamente abordados por Said em sua obra “Orientalismo”. Aziz explica que “o segundo tipo é o das colônias estratégicas. O mundo europeu, depois da era das grandes navegações, percebeu que alguns espaços poderiam ser colonizados de modo burocrático e administrativo, e ligeiramente bélico, em função do interesse estratégico que aquela área tivesse para a matriz de onde procediam as idéias de colonização”. Nesse período, os europeus colonizaram, por exemplo, o Canal de Suez, que Said analisa como um dos fatores centrais na possibilidade que o Ocidente teve de domesticar o Oriente. Aziz também cita o deserto do Saara, conquistado pelos franceses, como exemplo desse segundo tipo. O terceiro tipo, para Aziz o mais importante, são as colônias de enquadramento. “Alguns países poderosos iniciaram, no século XIX, um processo de enquadrar alguns países de menor força bélica, do ponto de vista burocrático e bélico. Foi caso da Índia, mais espetacular, pelos ingleses”. O geógrafo afirma que outras áreas sofreram esse tipo de influência, inclusive países latino-americanos, como o caso de Cuba. “Quando se diz república das Bananas, a gente fica logo sabendo que o problema foi enquadrar esses pequenos países, sobretudo da América Central, e sempre tendo em vista a capacidade administrativa e burocrática, e por trás disso, a força bélica, que quando não estava totalmente presente, como na Índia, ela ficou na retaguarda, como o caso de Cuba. Qualquer coisa que houvesse, interferia. Interferiram, por exemplo, em Cuba, e lá os cubanos conseguiram vitórias importantes”. Hoje, Aziz identifica um outro tipo de colônia, por enquadramento financeiro e burocrático. “Criou-se, por causa das diferenças econômicas entre países, do século XX, e agora segue no século XXI, com muita importância, entre os países hegemônicos, e que o principal é os Estados Unidos. Fundou-se um outro sistema de colonização, embora continue lá na retaguarda a força bélica, que pode interferir em momentos que eles considerem críticos. Muitos países estão hoje assim, através de bancos, negociações, OEA, um enquadramento muito delicado e perigoso. Basta ver no caso da América Latina, o esforço que o governo americano faz pela Alca. Ela define um protótipo de colônia de enquadramento financeiro, burocrático, e com possibilidades de grandes prejuízos para os países que achavam que pode se vincular ao ideário da Alca”. Para Aziz, essas formas de colonização se entrelaçam, sobrepõem e justapõem no percurso histórico. No Oriente Médio, ele diz que em certo momento o domínio colonial era feito pelos turcos sobre o Líbano e a Síria, “que não chega a ser um enquadramento bélico e burocrático, igual ao que aconteceu na Índia, mas é paralelo”. Depois da Segunda grande Guerra houve uma divisão das influências dos países externos e Inglaterra e França enquadraram a região cultural e economicamente, processo estudado em detalhes por Said em “Orientalismo”. “Hoje o inglês enquadra a lingüística regional”, afirma Aziz. No entanto, para o professor da USP, a interferência mais triste da história foi a dos Estados Unidos sobre o Iraque. “O que me impressiona é que ao fazer esse choque direto do bélico, do financeiro e o burocrático e o mercadológico, eles não previram os impactos que teria no pós-guerra. E existe uma variedade de trabalhos na Inglaterra e nos Estados Unidos sobre esses impactos”.