Arquitetura árabe chega ao Brasil nas naus portuguesas e depois com imigração sírio-libanesa

Sex, 02/06/2006 - 13:50
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Na foto, exemplo da influência. Acima, a torre do Palácio das Indústrias. Abaixo, minarete de mesquita de Damasco.Para quem passa pelo Palácio das Indústrias, em São Paulo, e observa suas torres, difícil imaginar que esta estrutura arquitetônica viajou séculos, mares e continentes para um dia chegar a uma construção paulistana para a qual, no dia-a-dia turbulento, se dá pouca importância. As torres do Palácio das Indústrias e outras diversas construções em território brasileiro têm em comum alguma forma de influência árabe, que chega ao país por diferentes caminhos e em diferentes tempos. Ao Brasil, os árabes chegaram significativamente no final do século XIX e início do XX vindos da região que hoje são Líbano e Síria. Mas sua influência arquitetônica chega muito antes ao Brasil, na carga cultural que os portugueses trouxeram à parte do continente americano que iriam dominar, na qual destruíram e construíram. E com os colonizadores, a influência arquitetônica é muito diferente daquela que observamos no prédio que foi a sede da prefeitura de São Paulo. Lygia Rocco, arquiteta e mestranda da USP, diz que a influência árabe-andaluza de origem ibérica se nota melhor no Norte-Nordeste, pólo do desenvolvimento inicial do Brasil colonizado. “As influências nas construções chegam através dos árabes e seus descendentes, os moçárabes, já assimilados na península Ibérica, pois oito séculos de convivência geraram uma fusão de culturas. E os moçárabes estão entre os primeiros povoadores e colonizadores do Brasil”. Uma importante influência que chega nessa época é na técnica construtiva, na utilização da terra para a estrutura da edificação – o adobe, a taipa e o tijolo cozido. Além disso, “os muros caiados de branco e a decoração das paredes com tijolos de barros formando padrões geométricos também são de influência árabe”, explica Lygia. Essa forma de construção surge com a vida no deserto, o que fez com que os árabes tivessem que adaptar suas moradias a um clima pouco ameno, na maior parte do tempo seco e com temperaturas altas. Andrea Piccini, arquiteto e professor da Faculdade de Arquitetura da USP, diz que a técnica construtiva que iria influenciar portugueses e espanhóis, e depois o Brasil, tinha como característica ser adaptada ao clima e ecologicamente perfeita. “Eles construíam com barro e adobe, ou seja, ecologicamente adaptada, pois era um lugar no qual chove poucas vezes. Em algumas regiões, como o Saara, ela é recoberta com giz, cal branca”. Esse material, segundo Andrea, era utilizado em desenhos de casas que procuravam ser fechadas para a visão externa por motivos de segurança, sem janelas, como se fosse uma pequena fortaleza, mas aberta por dentro, através de um pátio no centro da casa. Por ali, entrava a iluminação do dia e a pouca água das chuvas. Depois, com o islã, a cultura árabe acompanha a expansão do Império que nasce com Muhammad e, nesse caminho, a arquitetura árabe ganham contornos locais por onde se estabelece, como no mediterrâneo e na península Ibérica. A influência da técnica construtiva árabe que chega ao Brasil depois de passar pelos portugueses também se adapta ao clima sul-americano. Lygia explica que na região Nordeste, diferente das regiões desérticas do Oriente Médio, não há uma noite tão fria. Além disso, por se situar na zona tropical quente e úmida, o Brasil tem uma maior incidência de chuvas. “A utilização da argila e da terra para a elaboração do fechamento e também como estrutura nas edificações é um bom isolante térmico, mas precisa ser protegida da chuva, o que é feito pela utilização de beirais nos telhados. Também o cozimento da argila a torna mais durável”, explica Lygia. Já no século XX, a influência árabe chega de forma direta ao Brasil, através dos sírios e libaneses. São Paulo, mais do que a influência árabe-andaluza, recebe uma carga cultural maior desses árabes imigrantes. E isso se reflete na arquitetura. “É também um momento forte de imigração de outros povos, italianos, alemães, por exemplo. É o período do sincretismo na arquitetura, quando são utilizados elementos de vários tipos e períodos, como o gótico e o neoclássico. As edificações rígidas misturam vários aspectos. No palácios das Indústrias, as torres lembram os minaretes do norte da África e suas arcadas”, explica Lygia. Exemplos mais claros da influência árabe no Brasil podem ser vistos nos balcões rótulas de Olinda, os muxarabis de Diamantina, a taipa de pilão da Casa do Padre Inácio em Cotia e no revestimento dos azulejos da Igreja da Pampulha.