Série de verbetes informativos sobre os árabes: Crimes contra a humanidade, por Thiago Amparo e Lígia Cerqueira

Sex, 20/06/2025 - 20:51

 

Confira mais um verbete da série especial do ICArabe, que tem como objetivo aprofundar o conhecimento sobre o mundo árabe com responsabilidade e rigor. A iniciativa reafirma o compromisso da instituição com a disseminação de informação de qualidade e a superação de estereótipos, fortalecendo o caminho para uma sociedade mais consciente e bem informada.

Crimes contra a humanidade

Os chamados crimes contra a humanidade, na lei internacional, são atos cometidos no contexto de um ataque generalizado ou sistemático contra qualquer população civil, havendo conhecimento do ataque. Os atos que podem ser enquadrados como crimes contra a humanidade, desde que cumpram esta qualificação geral, são diversos, e incluem condutas como homicídio, extermínio, escravidão, deportação ou transferência forçada, prisão ou outra forma grave de privação de liberdade em violação do direito internacional, tortura, violência sexual, esterilização forçada ou outras de igual gravidade. A definição é do Artigo 7o. do Estatuto de Roma, tratado que fundamenta a jurisdição do Tribunal Penal Internacional (TPI), corte em Haia que responsabiliza indivíduos por crimes internacionais, entre eles contra a humanidade.

Diferentemente do crime de genocídio, os crimes contra a humanidade não requererem um dolo específico de destruir em todo ou em parte um grupo racial, étnico ou religioso, mas sim tem como alvo “qualquer população civil”. Diferentemente dos crimes de guerra (ou seja, de violações graves das regras humanitárias), os crimes contra a humanidade podem ser praticados em tempos de paz ou durante conflitos armados. A peculiaridade dos crimes contra a humanidade é exigir um ataque que seja parte de uma política generalizada ou sistemática de Estado ou de uma organização capaz de praticar ataques contra uma população civil nesta escala. Admite-se, no rol de atos que possam constituir crimes contra a humanidade, uma cláusula aberta de “outros atos desumanos de caráter semelhante, que causem intencionalmente grande sofrimento, ou afetem gravemente a integridade física ou a saúde física ou mental” (Artigo 7o., k, Estatuto de Roma).

 

Embora haja precedentes de condenações por crimes equivalentes ao que hoje chamados de crimes contra a humanidade desde o século 15 e, na era moderna, nos Julgamentos de Nuremberg  (1945-1946) e do Tribunal de Tóquio (1946-1948), um dos exemplos mais recentes é a ordem de prisão em 2025 pelo TPI contra o ex-presidente das Filipinas, Rodrigo Duterte, acusado de crime contra a humanidade de assassinar sua própria população como parte de uma política de esquadrões da morte e enquanto presidente do país na chamada “guerra às drogas”. Em 2024 o tribunal também expediu mandados de prisão contra Mohammed Diab Ibrahim Al-Masri (Mohammed Deif), chefe militar do Hamas, e contra o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, e seu ministro da Defesa, Yoav Gallant, sob acusações de crimes de guerra e contra a humanidade. As decisões estavam relacionadas a atos cometidos entre outubro de 2023 e maio de 2024.

thiago

Thiago Amparo é professor de direito internacional na FGV Direito SP e colunista do jornal Folha de São Paulo. Coordena na FGV o Centro de Pesquisa Aplicada em Direito e Justiça Racial da FGV SP e preside a Comissão Especial de Direito Internacional da OAB/SP.


ligia

Lígia Cerqueira é advogada, assistente de pesquisa do Centro de Pesquisa Aplicada em Direito e Justiça Racial da FGV SP e secretária da Comissão Especial de Direito Internacional da OAB/SP.